Os deputados que votaram a favor da reforma da Previdência no dia 3 de maio deram um enorme presente ao empresariado: acabaram com a multa de 40% do FGTS, em caso de demissão de trabalhador já aposentado.

Um exemplo: uma pessoa trabalhou por 30 anos numa empresa, aposentou-se e continuou trabalhando por mais cinco anos. A empresa o demite e ele não recebe nenhum centavo da multa indenizatória garantida pela Constituição.

A novidade foi introduzida ao texto pelo deputado Arthur Maia (PPS-BA), relator da PEC 287. Ele alterou o artigo 10 das Disposições Transitórias, exatamente a cláusula que assegura indenização na demissão sem justa causa — a todos os trabalhadores — no valor de 40% do FGTS de tudo o que foi depositado.

O golpe aplicado por Maia foi muito bem observado pelo advogado José Geraldo Santana, companheiro de luta e assessor jurídico da Contee. Ele denunciou a nova redação dada ao artigo 10 das Disposições Transitórias na CF:

Art. 10 …………………………………………………..

§ 4º Até que seja publicada a lei complementar a que se refere o inciso I do art. 7º da Constituição, o vínculo empregatício mantido no momento da concessão de aposentadoria voluntária não ensejará o pagamento da indenização compensatória prevista no inciso I. (NR)

A mudança, aprovada a boca pequena e patrocinada pelo empresariado, é uma das mais antigas reivindicações patronais: o lobby data de 1966, quando o FGTS substituiu o antigo regime de estabilidade. Desde então, por diversas vezes, a legislação foi alterada por pressão dos empresários.

Em 1988, entretanto, a Assembleia Nacional Constituinte, transformou a multa em direito constitucional, além de ampliar o valor de 10% para 40%. Ainda assim, o empresariado resistia ao pagamento para os aposentados demitidos. Por se tratar de uma questão constitucional, o caso foi parar Supremo Tribunal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 1721-3.

O julgamento ocorreu em 2006 e finalmente, os aposentados que continuaram a trabalhar tiveram o direito reconhecido. É esse direito que Arthur Maia e o bando que aprovou o texto substitutivo querem acabar.

(*) Professora, diretora do Sinpro-SP e colaboradora do Diap
(**) Título original

UMA LUTA DE MAIS DE 50 ANOS ESTÁ AMEAÇADA

O pagamento da multa indenizatória – hoje de 40% – envolve uma luta de mais de mais de 50 anos, diretamente ligada à proteção legal contra a demissão. Essa batalha data de 1966, quando o FGTS substituiu a o regime de estabilidade.

Beneficiados pela liberdade recém-adquirida de demitir, os patrões agora estavam interessados em reduzir os custos da demissão. Apenas dois meses depois da criação do FGTS (L. 5170), um decreto –lei condicionava a aposentadoria ao rompimento do vínculo empregatício.

O desligamento obrigatório era uma exigência meramente formal. Em muitos casos, no dia seguinte o vínculo era restabelecido. Se o empregado fosse despedido, a CLT – artigo 453 – garantia que ele fosse indenizado por todo o tempo trabalhado.

Para que os empregadores pudessem fugir da indenização sobre todo o período, era preciso mudar também a CLT. Em 1975, o artigo 453 foi alterado, beneficiando os empregadores. Pela nova regra, o trabalhador aposentado que voltasse ao trabalho, se demitido, seria indenizado apenas pelo tempo posterior ao benefício.

Em 1980, nova reviravolta a favor dos trabalhadores (L. 6.887) e, apenas nove meses depois, a contrarreação do empresariado.

Em 1988, porém, a multa indenizatória – agora de 40% sobre os depósitos do FGTS – tornou-se um direito constitucional. No ambiente de regulamentação das conquistas da Constituição, foi promulgada em 1991 a nova legislação previdenciária (L. 8213), que autorizava ao trabalhador aposentar-se sem o rompimento do vínculo empregatício. Se demitido, valia a Constituição: multa de 40% sobre todos os depósitos.

Entre 1991 e 2006, o lobby empresarial atuou como nunca para reverter a mudança. Um projeto de lei e edições sucessivas de medidas provisórias em 1993 (MP 381, arquivada pelo Congresso) e entre 1996 e 1997 (MP 1523, convertida na Lei 9.528).

Neste momento, a questão deslocou-se para o Supremo Tribunal Federal. Se a multa de 40% na demissão sem justa causa era um direito constitucional, nenhuma lei ordinária poderia restringi-la.

Em 2006, finalmente, a ADIN 1721-3 foi julgada a favor dos trabalhadores. Eis que agora, o fantasma ressurge de maneira inesperada, agravada pela tentativa de incorporar a restrição ao texto constitucional. Em que mundo nós estamos?

Fonte: DIAP