Pesquisa realizada pela consultoria Korn Ferry mapeou as prioridades dos profissionais de todos os continentes
Ter um horário de trabalho flexível tornou-se um fator crucial para profissionais ao redor do mundo. Essa foi uma das constatações do estudo “Workforce 2024”, realizado pela consultoria Korn Ferry, que entrevistou mais de 10.000 profissionais distribuídos pelos EUA, Reino Unido, Brasil, Oriente Médio, Austrália e Índia.
Quando perguntados sobre quais as coisas mais importantes que uma empresa deve oferecer, a liberdade de controlar os próprios horários ficou em primeiro lugar na média global e é um ponto especialmente relevante para pessoas com idades entre 55 e 65 anos (47%). Trabalhadores de até 24 anos formam o grupo que menos se importa com a flexibilidade (30%)
Escolher uma companhia que oferece remuneração generosa é a grande prioridade para pessoas que possuem, ao menos, 45 anos. Aproximadamente metade dos profissionais de 45 a 65 anos apontaram este como um fator decisivo. Já no ranking global, o salário ocupa o segundo lugar de importância.
Possuir uma empresa ou empregador estável se estabelece como o terceiro ponto mais importante para escolher uma companhia e chama atenção de, em média, 30% da força de trabalho ao redor do mundo. A importância de se trabalhar em modelo híbrido ou totalmente remoto também foi mais destacada pelos trabalhadores mais velhos, assim como a disponibilização de benefícios e recompensas além do salário.
O que te faz ter vontade de permanecer na empresa?
Os motivos que atraem as pessoas a uma nova corporação não são os mesmos que as fazem permanecer nela. O dinheiro e os benefícios passam a ser mais relevantes quando o candidato se torna um funcionário, levantou a pesquisa. Isso acontece porque “antes de começarmos numa empresa, analisamos aspectos concretos. Ao entrar no ambiente, outros se tornam relevantes já que pudemos experimentá-los”, analisa Adriana Rosa, líder regional de estratégia organizacional da Korn Ferry.
A insatisfação com os valores da empresa e a dificuldade de avançar dentro dela são pontos que levam os funcionários a cogitarem uma demissão, assim como a falta de estabilidade, má remuneração e inflexibilidade, apontou o estudo. Para Rosa, a estabilidade se relaciona à segurança psicológica, que pode ser adquirida adotando um ambiente mais inclusivo, que respeita e valoriza as diferenças, no qual se pode ser quem é e onde existe um diálogo aberto, assim como uma escuta de qualidade.
Híbrido é o favorito
Apesar de a pesquisa ter constatado que o modelo híbrido é o mais procurado pelos respondentes; pessoas em posição de liderança compõem os grupos que declaram valorizar mais o trabalho 100% presencial. Em contrapartida, 26% dos CEOs afirmam que, caso precisem procurar um novo trabalho, priorizariam empresas que possibilitassem atuação totalmente remota. Profissionais que não são líderes, por sua vez, representam a classe que tem menos interesse no modelo de trabalho presencial.
Através das declarações também é possível analisar que as mulheres se importam mais que os homens com o fator flexibilidade e, no geral, para 75% dos profissionais é crucial trabalhar de maneira flexível. Mais da metade (60%) dos trabalhadores afirmaram que continuariam em um emprego que odeiam caso a companhia oferecesse horários flexíveis.
“Creio que isso foi aprendido na pandemia e faz parte de um recorte histórico e geracional. A experiência de conseguir economizar de duas a quatro horas por dia em trânsito abriu espaço e tempo para novas experiências”, comenta Rosa. “Ao invés de estar num transporte público, a pessoa pode estudar um idioma, fazer academia ou preparar seu jantar”, complementa a especialista.
Ainda de acordo com Rosa, as famílias mudaram seus hábitos de convivência durante a pandemia e querem preservá-los. Além disso, a especialista compreende que, para as novas gerações, o trabalho pode ser feito de qualquer lugar com o domínio da tecnologia e isso se tornou um benefício. Para ela, outro ponto de atenção das empresas deve ser sobre como manter proximidade e identidade cultural coletiva em um cenário que todos estão inseridos nas próprias preferências.
Por outro lado, na perspectiva de Rodrigo Araújo, presidente da Korn Ferry Brasil, as pessoas estão vendo os benefícios que a flexibilidade pode trazer, mas não estão avaliando os riscos e, principalmente, as consequências que esse fator pode impactar. “Fica muito complexo a gente pensar em como manter esse pessoal engajado exclusivamente por uma liberdade, por uma flexibilidade de horário”, diz.
Salário x Contribuição
Com o objetivo de compreender a relação entre os salários e a contribuição dos funcionários, o estudo também mostrou que:
- 8% dos entrevistados dizem que “minha empresa me oferece um salário e benefícios que superam a minha contribuição para a empresa”;
- 54% dizem que “minha empresa me oferece um salário e benefícios que são compatíveis com minha contribuição para a empresa”;
- 38% dizem que “minha empresa me oferece um salário e benefícios que estão abaixo da minha contribuição”.
“De fato, as pesquisas de engajamento da maioria das empresas apontam que este é um item de insatisfação”, aponta Rosa. “O importante é que a empresa mantenha-se atenta aos movimentos de mercado, fazendo comparações adequadas para mostrar sua competitividade e reverter esta visão, que pode estar distorcida”, sugere. Ela defende que o problema deve ser resolvido por meio de uma conversa adulta e aberta, em que os profissionais analisam as expectativas e a própria performance.
Ansiedade com a tecnologia
O levantamento descobriu ainda que 65% das pessoas com menos de 55 anos estão ansiosas com o potencial das novas tecnologias, como inteligências artificiais. Para superar o medo, Araújo sugere uma postura “autodisruptiva”. “Uma maneira de romper com essa curva é você constantemente se desafiar”, aconselha. “O perfil dessa ‘autodisrupção’ remete muito a dimensões que nos levam a antecipar problemas, ter a capacidade de tomar decisões difíceis e confiar no coletivo”, acrescenta.
Ele ainda destaca que para alcançar essa postura pode-se buscar feedbacks e estabelecer relações mais próximas com pessoas diferentes, de características distintas, a fim de ampliar a perspectiva. A partir dessas práticas, Araújo acredita que o trabalhador irá absorver as tendências com mais facilidade.
CEOs duvidam das próprias realizações
De funcionários não líderes (32%) a CEOs (58%), a porcentagem de profissionais que admitiu sofrer da síndrome do impostor é relevante em diversos níveis de carreira. Os norte-americanos se destacam nesse sentido. Entre os CEOs dos EUA, 71% afirmam possuir a condição.
“As empresas precisam criar ambientes nos quais a vulnerabilidade é aceitável, onde as pessoas possam falar do que não se sabe, valorizando, inclusive, a busca por aprender”, reflete Rosa. “Quando estamos num grupo saudável e colaborativo, temos mais apoio e não sentimos que todas as soluções têm que ser dadas individualmente”, complementa. Por fim, para auxiliar na superação do cenário, a especialista em estratégia organizacional recomenda feedbacks sobre o que não está bem, momentos de reconhecimento e comemoração.
Fonte: Jornal Valor Econômico
04 de outubro de 2024